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O regime "monofásico" da tributação das contribuições ao PIS e a COFINS, previsto pela Lei 10.147/00

Neste trabalho daremos ênfase a Lei 10.147/00, a qual regula o "regime monofásico" relativo à distribuição e venda de produtos farmacêuticos, perfumaria, toucador e de higiene pessoal.

Autor: Edson Benassuly ArrudaFonte: Fiscosoft

1. Introdução

A Receita Federal do Brasil vem, sistematicamente, se manifestando pela impossibilidade da manutenção dos créditos de PIS e COFINS das empresas sujeitas ao chamado "regime monofásico" e tributadas sob a alíquota zero, quando da venda dos produtos elencados pelas leis nº. 10.637/02, e nº. 10.833/03, entre eles destacamos:

a) gasolina e suas correntes, exceto gasolina de aviação;

b) óleo diesel e suas correntes;

c) GLP derivado de petróleo ou de gás natural;

d) querosene de aviação;

e) biodiesel;

f) álcool hidratado para fins carburantes;

g) alguns produtos farmacêuticos;

h) alguns produtos de perfumaria, de toucador ou de higiene pessoal;

i) certas máquinas e veículos;

j) água, refrigerante, cerveja e preparações compostas;

l) embalagens destinadas ao envasamento de água, refrigerante e cerveja;

m) pneus novos de borracha e câmaras de ar de borracha; e

n) algumas autopeças.

Por oportuno, as empresas varejistas e atacadistas que estão utilizando os referidos créditos, têm sofrido autuações fiscais em razão de o órgão fazendário entender que a venda dos produtos, efetuadas com alíquota zero, no sistema de "tributação monofásica", não confere o direito creditício relacionados à aquisição destes bens.

Ocorre que este ato é manifestamente abusivo e antijurídico, pois o artigo 17 da Lei n. 11.033/04 determina que as vendas efetuadas com suspensão, isenção, alíquota zero ou não-incidência da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS não impedem a manutenção, pelo vendedor, dos créditos vinculados a essas operações, conforme veremos a seguir.

2. O suposto regime de PIS e COFINS monofásico instituído pela Lei 10.147/00.

Neste trabalho daremos ênfase a Lei 10.147/00, a qual regula o "regime monofásico" relativo à distribuição e venda de produtos farmacêuticos, perfumaria, toucador e de higiene pessoal. Vejamos o que dispõe o artigo 1º deste diploma legal:

Art. 1º A contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público - PIS/Pasep e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - Cofins, devidas pelas pessoas jurídicas que procedam à industrialização ou à importação dos produtos classificados nas posições 30.01, 30.03, exceto no código 3003.90.56, 30.04, exceto no código 3004.90.46 e 3303.00 a 33.07, nos itens 3002.10.1, 3002.10.2, 3002.10.3, 3002.20.1, 3002.20.2, 3006.30.1 e 3006.30.2 e nos códigos 3002.90.20, 3002.90.92, 3002.90.99, 3005.10.10, 3006.60.00, 3401.11.90, 3401.20.10 e 9603.21.00, todos da Tabela de Incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados - TIPI, aprovada pelo Decreto nº 4.070, de 28 de dezembro de 2001, serão calculadas, respectivamente, com base nas seguintes alíquotas: (Redação dada pela Lei nº 10.548, de 13.11.2002)
I - incidentes sobre a receita bruta decorrente da venda de: (Redação dada pela Lei nº 10.865, de 2004)
a) produtos farmacêuticos classificados nas posições 30.01, 30.03, exceto no código 3003.90.56, 30.04, exceto no código 3004.90.46, nos itens 3002.10.1, 3002.10.2, 3002.10.3, 3002.20.1, 3002.20.2, 3006.30.1 e 3006.30.2 e nos códigos 3002.90.20, 3002.90.92, 3002.90.99, 3005.10.10, 3006.60.00: 2,1% (dois inteiros e um décimo por cento) e 9,9% (nove inteiros e nove décimos por cento); (Incluído pela Lei nº 10.865, de 2004)
b) produtos de perfumaria, de toucador ou de higiene pessoal, classificados nas posições 33.03 a 33.07 e nos códigos 3401.11.90, 3401.20.10 e 96.03.21.00: 2,2% (dois inteiros e dois décimos por cento) e 10,3% (dez inteiros e três décimos por cento); (Incluído pela Lei nº 10.865, de 2004)

Destarte, de acordo com o artigo 2º da lei supracitada, aplica-se a alíquota de 0% de PIS e Cofins para as vendas realizadas por distribuidores atacadistas, assim como para os varejistas, salvo as empresas optantes do SIMPLES, literis:

Art. 2º São reduzidas a zero as alíquotas da contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins incidentes sobre a receita bruta decorrente da venda dos produtos tributados na forma do inciso I do art. 1º, pelas pessoas jurídicas não enquadradas na condição de industrial ou de importador.
Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica às pessoas jurídicas optantes pelo Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte - Simples.

Esta sistemática de tributação foi mantida pelas Leis 10.637/02 e 10.833/03, em seus arts. 2º, § 1º, in verbis:

Art. 2º Para determinação do valor da contribuição para o PIS/Pasep aplicar-se-á, sobre a base de cálculo apurada conforme o disposto no art. 1º, a alíquota de 1,65% (um inteiro e sessenta e cinco centésimos por cento).
§ 1º Excetua-se do disposto no caput a receita bruta auferida pelos produtores ou importadores, que devem aplicar as alíquotas previstas: (Incluído pela Lei nº 10.865, de 2004)
II - no inciso I do art. 1º da Lei nº 10.147, de 21 de dezembro de 2000, e alterações posteriores, no caso de venda de produtos farmacêuticos, de perfumaria, de toucador ou de higiene pessoal nele relacionados; (Incluído pela Lei nº 10.865, de 2004) (grifo nosso)

Cumpre destacar que o regime supraexposto comumente chamado de "monofásico" pela legislação tributária, órgãos fazendários, doutrina e jurisprudência, se analisado com rigor técnico-jurídico, é empregado de forma incorreta. Explicamos, no regime monofásico, ou regime de tributação concentrada, propriamente dito, a incidência tributária ocorre em uma única operação, sendo esta característica elementar para sua determinação, conforme dispõe o artigo 149, § 4º da CRFB:

Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo.
(...)
§ 4º A lei definirá as hipóteses em que as contribuições incidirão uma única vez. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)

Neste diapasão, o regime monofásico deve ser entendido como uma sistemática em que há a ocorrência de um único fato gerador, onde a tributação é suportada por, apenas, um elo da cadeia produtiva, sendo que as demais operações não se subsumem a regra de incidência tributária. Já na sistemática "monofásica" da Lei 10.147/00, o importador ou produtor suportam uma alíquota majorada de PIS e COFINS, enquanto os varejistas e atacadistas são tributados sob alíquota zero. Neste sentido, o posicionamento de Adolpho Bergamini é esclarecedor:

"Em decorrência, a apuração do PIS/COFINS na forma prescrita nas Leis supramencionadas em verdade não são monofásicas, porque não há uma única incidência na origem da cadeia de circulação interna das mercadorias (isto é, nas vendas do fabricante e do Importador). O que há (e isto é certo) é uma cadeia plurifásica de incidência tributária, na qual a legislação determinou alíquota de determinados contribuintes é majorada e as alíquotas aplicáveis a outros contribuintes é 0%." (2)

De acordo com o autor, os únicos regimes de tributação monofásica existentes em nosso ordenamento jurídico são os previstos pelas Leis 10.506/02 e 11.116/05; os quais prescrevem normas sobre a incidência única de contribuições sobre a comercialização de querosene de avião e biodiesel, respectivamente.

A conseqüência desta conclusão está diretamente relacionada ao direito de utilização de créditos relativos aos contribuintes sujeitos a alíquota zero, prevista na Lei 10.147/00. Este diploma legal, como já vimos, não estabelece o regime monofásico para os produtos farmacêuticos, de perfumaria, toucador e higiene pessoal, mas sim um regime plurifásico com alíquotas diversas ao produtor e importador, em relação aos distribuidores, varejistas e atacadistas, onde os primeiros suportam alíquotas majoradas e os últimos ficam sujeitos a alíquota zero.

Por oportuno, não se pode fazer confusão entre imunidade, isenção e alíquota zero. A imunidade consiste na não incidência tributária constitucionalmente prevista, ou seja, por força do mandamento constitucional não ocorre o fato gerador da obrigação tributária, logo não há que se falar em constituição do crédito tributário. Na isenção a dinâmica é semelhante a da imunidade, a diferença básica entre elas está no fato de a isenção ser uma norma de não incidência tributária prevista na legislação infraconstitucional, enquanto a imunidade está prevista pela Lei Maior. Já na alíquota zero, há incidência da regra matriz em virtude da ocorrência do fato imponível realizado pelo contribuinte, contudo, ao se quantificar a obrigação tributária, conjugando o aspecto quantitativo do fato gerador, base de cálculo e alíquota, temos como resultado o crédito tributário no valor 0 (zero); pois a base de cálculo submetida a alíquota 0 (zero) terá sempre como resultado 0 (zero).

A desoneração tributária por meio da imunidade, isenção, e alíquota zero, apesar de possuir o mesmo resultado financeiro, o não pagamento do tributo, traz conseqüências distintas de ordem material. Sendo assim, o regime previsto na Lei 10.147/00, o qual se convencionou de chamar "monofásico" é, de fato, um regime plurifásico, mais precisamente, consiste em um regime tributário não-cumulativo. Se observarmos a tributação de toda a cadeia produtiva, perceberemos que produtores e importadores são gravados com alíquotas superiores de PIS e COFINS, gerando débitos destas contribuições, em decorrência da venda dos bens para distribuidores, atacadistas e varejistas. Estes ao adquirirem os produtos farmacêuticos, de perfumaria, toucador e higiene pessoal, devem tomar o crédito do PIS e da COFINS, resultante do débito da operação anterior. Esta sistemática é decorrência lógica do sistema não-cumulativo e expressamente assegurado pelo artigo 17 da Lei nº 11.033/04 (supracitado).

Adolpho Bergamini coaduna com este posicionamento e conclui:

"nesse contexto, entendemos que o posicionamento da Receita Federal a cerca da impossibilidade de tomada de crédito sobre o valor de aquisição dos próprios produtos sujeitos ao regime "monofásico" é:
(i) ilegal porque afronta o próprio regime não cumulativo adotado ao PIS/COFINS; e
(ii) inconstitucional porque atribui tratamento diferenciado a contribuintes que se encontram em situações jurídicas equivalentes. De fato, os distribuidores, atacadistas e varejistas de produtos "monofásicos" estão inseridos em uma cadeia plurifásica de incidência da mesma forma que contribuintes que comercializam outros produtos, então deve ser conferidos a eles (comerciantes de produtos "monofásicos") o mesmo direito ao crédito atribuído aos comerciantes de produtos "não monofásicos"." (3)

Importante destacar que o Poder legislativo, órgão da República Federativa do Brasil que possui competência para editar leis em matéria tributária, fez expressa previsão do direito a manutenção do crédito de PIS e COFINS dos contribuintes sujeitos a alíquota zero, previstos pela Lei 10.147/00. Não obstante, o Poder Executivo, conjuntamente com a Receita Federal do Brasil, tentam violar o princípio da legalidade, contrariando expressa disposição legal (artigo 17 da Lei nº 11.033/04); o que é inconcebível em um Estado Democrático de Direito.

A Presidência da República vem, sistematicamente, tentando aprovar medidas provisórias com o intuito de revogar o direito a manutenção do crédito previsto pelo artigo 17 da Lei nº 11.033/04. Neste diapasão, podemos citar as MP nº 413/08 e 451/08.

A MP nº 413/08 tentou introduzir o § 14 (3) , no artigo 3º da Lei 10.637/02, o qual buscava excepcionar a regra do artigo 17 da Lei nº 11.033/04 em relação aos distribuidores de produtos farmacêuticos, perfumaria, toucador e higiene pessoal, regidos pela Lei 10.147/00. Contudo, o Congresso Nacional em uma resposta direta as pretensões escusas do Poder Executivo e da Receita Federal do Brasil, rejeitou este dispositivo não o convertendo em lei.

Do mesmo modo, a MP 451/08 buscou alterar a Lei 10.637/02, inserindo § 15 (4), no artigo 3º deste diploma legal. O objetivo era o mesmo da MP anterior, impossibilitar a tomada de crédito de varejistas e atacadistas submetidos ao sistema "monofásico". Mas para frustração do Governo Federal, a Lei 11.945/09 excluiu o seu conteúdo dando nova redação para o § 15 do artigo 3º da Lei 10.637/02.

As duas tentativas do Poder Executivo em vedar o direito de crédito da impetrante foram rejeitadas pelo Congresso Nacional, demonstrando de forma insofismável a legalidade da manutenção e utilização de créditos pelos contribuintes submetidos ao sistema plurifásico previsto pela Lei 10.147/00.

O ato ilícito da Receita Federal em não reconhecer este direito creditício viola frontalmente o princípio da reserva legal em matéria tributária. O que pretende o órgão fazendário? Transforma-se em legislador positivo, inovando no mundo jurídico por meio de soluções de consulta? O Poder Judiciário, guardião da Carta Constitucional, não pode deixar que ela seja violada desta maneira, caso contrário, regrediremos para o Estado Medieval onde os tributos podiam ser livremente impostos aos súditos ao bel prazer do soberano. Até quando o Poder Executivo tentará ferir os princípios democráticos de nossa República, reeditando de forma compulsiva Medidas Provisórias rejeitadas pelo Congresso Nacional, alterando-as apenas em seu texto, mas tendo a mesma finalidade? Precisamos dar um basta nestas violações de direitos fundamentais, ratificando a vontade do legislador em respeitar a capacidade contributiva das empresas e permitir o avanço da economia e da livre iniciativa.

O TRF3, analisando o mérito do presente mandamus, proferiu decisão favorável no agravo de instrumento nº 200703000961053, interposto por um contribuinte (anexo). Destacamos a parte final desta decisão:

"O recolhimento das mencionadas contribuições se dá numa única fase da cadeia produtiva, vale dizer, no caso, os importadores e as pessoas jurídicas que se dedicam à industrialização dos referidos produtos recolhem o valor dos tributos por toda a cadeia produtiva, de modo que, em relação aos comerciantes, como é o caso da agravante, a alíquota fica reduzida a zero (art. 49 combinado com o art. 50, inciso I, da Lei 10.833/03).
A lei n. 11.033, de 21 de dezembro de 2004, por sua vez, prescreve, em seu art. 17, o que segue:
"Art. 17. As vendas efetuadas com suspensão, isenção, alíquota 0 (zero) ou não incidência da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS não impedem a manutenção, pelo vendedor, dos créditos vinculados a essas operações."
Tal dispositivo, ao menos em uma primeira análise, confere à Agravante o alegado direito ao aproveitamento dos respectivos créditos.
Com efeito, no regime apontado, todos os demais elos da cadeia produtiva, à exceção do produtor ou importador - que são responsáveis pelo recolhimento do tributo à uma alíquota mais gravosa - ficam desobrigados do recolhimento porque, sobre a receita por eles auferidas, aplica-se a alíquota zero.
Ora, o fato de tal receita estar submetida à alíquota zero, não obsta que os contribuintes mantenham os créditos de todas as aquisições por eles efetuadas, como expressamente assegura o art. 17 da Lei n. 11.033/04.
O entendimento contrário parece consubstanciar ofensa ao princípio da capacidade contributiva (art. 145, §1º da C.R.)., aplicável às contribuições cuja materialidade revista a natureza de imposto, como é o caso do PIS e da COFINS.
A par da verossimilhança do alegado direito, vislumbro fundado receio de dano de difícil reparação, traduzido na fato de que a eventual concessão da medida pleiteada, tão somente a final, resultaria na sua ineficácia, pois sem o reconhecimento do direito à sistemática da não-cumulatividade, restaria a agravante, tão somente, pleitear a sua restituição, mediante via processual custosa e demorada.
Ante o exposto, CONCEDO O EFEITO SUSPENSIVO PLEITEADO."

O Poder Judiciário e Legislativo já deram clara posição quanto ao direito de manutenção dos créditos de PIS e Cofins no regime previsto na Lei 10.147/00. Desta feita, toda e qualquer tentativa do Poder Executivo e da Receita Federal do Brasil em denegar o usufruto deste direito, consiste em um ato odioso e verdadeiro atentado a Democracia e ao Estado de Direito.

3. Direito de manutenção dos créditos de PIS e COFINS

Preliminarmente, o inc. II, do § 2, do art. 3º das Leis nº 10.637/02 e 10.833/03; expõe que não dará direito a crédito o valor da aquisição de bens ou serviços não sujeitos ao pagamento da contribuição, inclusive no caso de isenção, esse último quando revendidos ou utilizados como insumo em produtos ou serviços sujeitos à alíquota 0 (zero), isentos ou não alcançados pela contribuição, vejamos:

§ 2º Não dará direito a crédito o valor: (Redação dada pela Lei nº 10.865, de 2004)
II - da aquisição de bens ou serviços não sujeitos ao pagamento da contribuição, inclusive no caso de isenção, esse último quando revendidos ou utilizados como insumo em produtos ou serviços sujeitos à alíquota 0 (zero), isentos ou não alcançados pela contribuição. (Incluído pela Lei nº 10.865, de 2004)

A Receita Federal do Brasil interpreta este último dispositivo, como uma vedação ao direito de crédito de PIS e COFINS, relativos à venda de produtos sujeitos a alíquota zero. De acordo com este entendimento, varejistas e atacadistas sujeitos ao "sistema monofásico" não poderiam utilizar os créditos decorrentes da venda destes bens. Tal posicionamento encontra-se formalmente discriminado em várias soluções de consultas expedidas pelo órgão fazendário, entre elas destacamos:

SOLUÇÃO DE CONSULTA Nº 15 de 22 de Janeiro de 2009
ASSUNTO: Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - Cofins
EMENTA: TRIBUTAÇÃO CONCENTRADA. REGIME DE APURAÇÃO DA CONTRIBUIÇÃO PARA A COFINS. ALÍQUOTA APLICÁVEL NAS OPERAÇÕES COMERCIALIZAÇÃO, NO MERCADO INTERNO, DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS MONOFÁSICOS. O importador e o industrial dos produtos classificados nos itens 3002.10.1, 3002.10.2, 3002.10.3, 3002.20.1, 3002.20.2, e nos códigos 3002.90.20, 3002.90.92 e 3002.90.99 da TIPI, relativamente à receita com as vendas no mercado interno desses produtos, devem apurar a Cofins aplicando as alíquotas estabelecidas no art. 1º, inciso I, "a", da Lei nº 10.147, de 2000, na redação dada pela Lei nº 10.865, de 2004. Se apurarem o IRPJ pelo lucro presumido, essas operações submetem-se ao regime cumulativo das contribuições. Se apurarem o IRPJ pelo lucro real, a partir de 01/08/2004, essas operações submetem-se ao regime não cumulativo, podendo eles descontar os respectivos créditos das contribuições conforme a legislação vigente. À receita obtida com a venda no mercado interno dos produtos classificados nos itens 3002.10.1, 3002.10.2, 3002.10.3, 3002.20.1, 3002.20.2, e nos códigos 3002.90.20, 3002.90.92 e 3002.90.99 da TIPI, por pessoas jurídicas que não sejam seus importadores ou industriais aplica-se a alíquota 0%(zero por cento) da Cofins. Não há direito a crédito relativamente a esses produtos, quando adquiridos por essas pessoas jurídicas no mercado interno, nacionais ou estrangeiros, para revenda.

Em que pese o posicionamento do fisco, a interpretação dos institutos jurídicos deve ser realizada de forma sistemática. Um dispositivo normativo não pode ser analisado fora do contexto da própria lei que o prevê, tampouco apartado de outros diplomas legais como outras normas que regulam a matéria, a exemplo do Código Tributário Nacional e da própria Constituição Brasileira; sob pena de colapso do sistema jurídico-tributário.

Neste contexto, destacamos o artigo 17 da Lei nº 11.033/04, segundo o qual, as vendas efetuadas com suspensão, isenção, alíquota 0 (zero) ou não incidência da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS não impedem a manutenção, pelo vendedor, dos créditos vinculados a essas operações. Isso significa que as operações realizadas por distribuidores, varejistas e atacadistas relativas aos bens inseridos no "regime monofásico", ainda que submetidos ao sistema de tributação sujeitos a alíquota zero, não impedem os contribuintes de realizarem a manutenção dos créditos de todas as aquisições por eles efetuadas, especialmente dos próprios produtos, como lhes garante a aludida norma, infra:

Art. 17. As vendas efetuadas com suspensão, isenção, alíquota 0 (zero) ou não incidência da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS não impedem a manutenção, pelo vendedor, dos créditos vinculados a essas operações.

Com isso, conclui-se que o artigo 17 da Lei nº 11.033/04 revogou inc. II do § 2, do art. 3º das Leis nº 10.637/02 e 10.833/03.

Essa lógica é facilmente deduzida pela análise do "conflito de leis no tempo", regido pela Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto-Lei nº 4.657/42). De acordo com esta norma de caráter geral, a lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior (5).

Há incompatibilidade entre o artigo 3º, § 2º, II, das Leis nº 10.637/02 e 10.833/03 (incluídos pela Lei nº 10.865, de 2004) e o artigo 17 da Lei nº 11.033/04; pois os primeiros não permitem a tomada de créditos enquanto o segundo assegura este direito. Neste mister, em razão da Lei nº 11.033/04 ser posterior as Leis nº 10.637/02 e 10.833/03, estas estão revogadas por aquela.

Em artigo publicado no site Fiscosoft (6) , Helenilson Cunha Pontes, assim se posiciona:

"Diante da clareza do art. 17 da Lei nº 11.033/04 não há como negar aos contribuintes atacadistas ou varejistas de qualquer dos produtos sujeitos à tributação monofásica (combustíveis, medicamentos, automóveis, autopeças, etc) o direito ao crédito relativo à aquisição destes produtos.
O art. 17 da Lei nº 11.033/04, a claras luzes, por ser norma posterior, regulando a mesma matéria - alcance do direito de crédito - revogou o comando do art. 3º, I, letra "b" da Lei nº 10.833/03 que negava o aludido direito de crédito.
Diante da clareza do direito que a legislação lhes confere, cabe aos contribuintes buscarem judicialmente o direito aos créditos que o Fisco Federal vem lhes negando através de respostas a consultas, em manifesta contrariedade ao preceito do artigo 17 da Lei nº 11.033/04."

Resta evidente, que o artigo 17 da Lei nº 11.033/04 está em vigor e possui plena eficácia, conferindo aos contribuintes o direito de opor seu direito de crédito contra a Fazenda, seja pela via administrativa no sistema PER/DCOMP ou acionando o Poder Judiciário para reconhecimento do seu direito.

4. Conclusão

Por todo o exposto, conclui-se que a majoração das alíquotas no sistema de tributação plurifásico previsto pela Lei 10.147/00, onde produtores e importadores arcam com uma alíquota majorada e os demais elos da cadeia produtiva, ficam sujeitos a alíquota zero, onera, em demasia, a carga tributária dos contribuintes, a menos que seja respeitada a sistemática da não-cumulatividade, possibilitando que distribuidores, varejistas e atacadistas possam aproveitar os créditos gerados nas operações anteriores, sob pena de ofensa direta a capacidade contributiva, prevista no art. 145, § 1º da CRFB.

Notas

(1) BERGAMINI, Adolpho. PIS e COFINS na teoria e na prática, uma abordagem completa dos regimes cumulativos e não cumulativos. Org. Adolpho Bergamini e Marcelo Magalhães Peixoto. São Paulo: MP Ed., 2009, pg. 605.

(2) Op. Cit. p. 610.

(3) § 14. Excetuam-se do disposto neste artigo os distribuidores e os comerciantes atacadistas e varejistas das mercadorias e produtos referidos no § 1º do art. 2º desta Lei, em relação aos custos, despesas e encargos vinculados a essas receitas, não se aplicando a manutenção de créditos de que trata o art. 17 da Lei no 11.033, de 21 de dezembro de 2004." (NR)

(4) § 15. Sem prejuízo da vedação constante na alínea "b" do inciso I do caput, excetuam-se do disposto nos inciso II a IX do caput os distribuidores e os comerciantes atacadistas e varejistas das mercadorias e produtos referidos no § 1º do art. 2º, em relação aos custos, despesas e encargos vinculados às receitas com a venda desses produtos. (Incluído pela Medida Provisória nº 451, de 2008)

(5) Art. 2º Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue.
§ 1º A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.

(6) http://www.fiscosoft.com.br/main_index.php?home=home_artigos&m=_&nx_=&viewid=149865
Sistema eletrônico de compensação de tributos federais no âmbito da Receita Federal do Brasil.